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Dando continuidade à reportagem sobre ações culturais durante a pandemia da COVID-19, o Matraca Cultural também conversou com os artistas Luiz Fernando Almeida e Eduardo Martini que, embora estejam vivendo esse momento de modo distinto, compartilharam sua preocupação com o cenário cultural brasileiro e como este poderá ser ainda mais afetado em razão das mudanças ocorridas. 

“Eu prefiro acreditar que o Teatro não vai morrer” 

Essas palavras expressam a esperança do ator, diretor e produtor cultural Luiz Fernando Almeida com o cenário artístico, mesmo em tempos de paralisação de muitas atrações culturais por decorrência da pandemia.

Antes do isolamento, o ator estava em cartaz com os monólogos Dama da Noite e Gotas de Codeína. Mas, pelo fato de ambos os espetáculos conterem momentos de interação com o público que, na visão de Almeida, não seriam contemplados pela câmera da mesma forma, ele preferiu não virtualizá-los. “Eu não entregaria algo com a mesma qualidade do presencial”, completa.

O produtor cultural ressalta que, especialmente neste período de isolamento social, os artistas, como sempre, possuem um papel fundamental de entreter quem está em casa. “Mesmo perseguidos por esse governo infame, os trabalhadores da arte estão a serviço da população. É admirável!”. 

O ator e produtor cultural Luiz Fernando Almeida

Almeida também sente que, em tempos de quarentena, há um desespero dos artistas, em que ele se inclui, por comunicação, diante da saudade dos palcos. Porém, ele vê com cautela a imensa quantidade de lives artísticas. Ele acredita que o universo online contempla bem a realização de shows, entrevistas e contação de histórias, mas, quando se trata do teatro a serviço do online, ele considera perigoso criamos este hábito do on demand, que pode se tornar irreversível e prejudicial para todos nós. 

“Fala-se muito em novos tempos, novos formatos como uma forma de justificar essa adesão. Eu prefiro acreditar que o Teatro não vai morrer! Ele resistiu a tudo e resistirá mais uma vez, eu acredito nisso.”

Em relação ao setor audiovisual, Almeida considera que há uma preocupação do mercado em relação ao futuro do cinema, por exemplo, em um momento pós-pandemia. “Nós não sabemos quando e como voltaremos, ainda não temos os protocolos para este retorno definidos em comum acordo.”

 No entanto, ele acredita que em relação a tal setor, o on demand já vinha ganhando espaço e agora tende a crescer consideravelmente. “Muita gente passou a produzir para a internet, de maneira independente e o público gosta porque cria identificação imediata”, completa.

Quanto à valorização da cultura, para Almeida, ela nunca foi considerada essencial no Brasil. “Na Alemanha, os artistas receberam todo o apoio do governo porque eles entendem que a cultura é fundamental para o desenvolvimento humano. ” Já em São Paulo, o ator lembra que o governo e algumas instituições têm oferecido soluções paliativas de apoio aos artistas, mas que não são suficientes. 

Ele aponta que a classe artística tem se articulado para ajudar seus pares com ações de arrecadação de cestas básicas e até financeiras, pois os prejuízos para a cultura são incalculáveis, considerando os milhões de profissionais parados, sem qualquer renda ou suporte. “Nem o auxílio emergencial contemplou a todos os artistas. ”.

O produtor cultural acredita que, além de serem os primeiros afetados pela pandemia, os setores de cultura e entretenimento serão os últimos a voltarem à normalidade. E, para complicar, novos surtos de contágio são esperados com o afrouxamento das restrições. 

Mas, quando seria esse retorno? Para Almeida, é preciso estudar casos específicos em outros países, a fim de termos uma melhor visão sobre a nossa própria retomada. “No geral, interações sociais como um todo estão sendo repensadas. Este tipo de mudança representa um impacto enorme em países como o Brasil, onde temos a cultura de beijar no rosto das pessoas que acabamos de conhecer. Precisamos pensar em soluções que levem em conta nossa limitação em termos de testes de massa, nossas normas sociais de privacidade, liberdades individuais e a cultura brasileira”, conclui.

Comédia e oração online para estes tempos de isolamento 

Conhecido por interpretar a personagem Neide Boa Sorte, que surgiu no programa da Hebe Camargo e acabou ganhando grande destaque, além de já ter feito inúmeros outros trabalhos artísticos, o ator e diretor Eduardo Martini não deixou de se conectar com o público, mesmo em isolamento. O artista tem se dividido entre vídeos de personagens cômicos e lives.

Ele começou gravando vídeos com sua personagem Neide Boa Sorte, após ter uma intuição de que se ele divertisse as pessoas, ele também se divertiria. E, após fazer vários vídeos e postar um por dia, eles viralizaram rapidamente. “Tudo se tornou uma grande diversão e um grande trabalho. Eu acredito que a Neide foi revivida. Eu reestruturei algumas coisas da personagem, porém foi tudo muito intuitivo, pelo prazer”. 

A personagem Neide Boa Sorte

O ator também fez gravações para um projeto chamado “Os Barbosa”. Com texto de Regiana Antonini e Stephano Martolla, trata-se da história de uma família em isolamento, cujo filho está longe, e apresentam os conflitos do dia a dia, em que Martini interpreta o pai Dirceu, em forma de sátira.

E não para por aí no que se refere a divertir o público: o artista ainda grava vídeos interpretando a personagem Dinha, uma empregada que ele já fazia há tempos e que aparecia no programa da Adriane Galisteu; e a personagem Alice no País das Maravilhas, que surgiu numa peça em que atuou chamada Contos de Barbas, de Tiago Luchi. 

Tantos conteúdos divertidos alegraram a quarentena de amigos, artistas e fãs de Martini, que recebeu um feedback positivo de muitas pessoas. O artista também conta que ganhou milhares de seguidores em suas redes sociais depois que começou a reunir internautas diariamente, ao meio dia, em suas lives, para momentos de oração e espiritualidade, em que ele dá palavras de conforto ao público e os incentiva a cultivarem a positividade. 

Assim, ele ressalta que, nas redes sociais, por exemplo, a qualidade deve ser muito mais valorizada do que a quantidade, ou seja, antes de se atentar para o número de seguidores, é importante analisar o nível das informações postadas. “Há pessoa muito interessantes fazendo diversas ações bacanas e falando sobre vários assuntos”, afirma Martini que também tem feito entrevistas em suas lives.  

O ator Eduardo Martini

Mas, uma questão que também o preocupa é a desvalorização da cultura, já que, para Martini, as pessoas ainda não aprenderam a valorizá-la, principalmente quando as produções são pagas e, no caso das lives, que têm apresentado conteúdo gratuito, pode haver um risco maior de tal desvalorização. “Quando alguém compra um ingresso de teatro, por exemplo, mesmo que custe cinco reais, se a peça for boa, a pessoa poderá voltar. Já quando se trata de algo gratuito, alguns podem pensar: ‘como é de graça, qualquer hora eu vejo”. 

Para ele, não se trata de um cenário atual, mas que sempre existiu já que a cultura nunca foi valorizada como deveria ser, assim como a educação. “Muitas pessoas gostam de criticar a Lei Rouanet, por exemplo, sem ao menos conhecê-la, pois o brasileiro, muitas vezes, se baseia apenas no achismo. Se a lei existe é para ser usufruída. Quem é mau caráter, não fará bom uso dela e quem é bom caráter fará bom uso.” 

É óbvio que num cenário pandêmico, setores como saúde e alimentação serão priorizados, mas Martini ressalta que a corrupção acaba prejudicando todos eles, incluindo a cultura. 

Para concluir, Martini disse estar lidando com a pandemia de forma muito positiva. “Eu me sinto privilegiado por estar em casa, com saúde, sou muito agradecido a Deus e ao Universo por isso. No momento sigo trabalhando, produzindo conteúdo para duas empresas, o que me deixa muito feliz. Eu trabalho em casa, com a minha arte, fazendo aquilo que amo”. De acordo com o ator, a pandemia tem mostrado que ninguém é melhor do que ninguém, pois, independente de classe social, raça ou gênero, todos estão suscetíveis ao vírus. 

Além disso, ele afirma que o momento atual mostrará quem realmente está disposto a fazer a diferença, como os atores e blogueiros que se preocupam em promover ações sérias e não dar maus exemplos ao público, como a influenciadora Gabriela Pugliesi que promoveu uma festa em pleno isolamento, colocou os vídeos nas redes sociais e acabou perdendo patrocínio, o que lhe gerou um prejuízo de quase R$ 3 milhões. “O empresariado está vendo a importância de se investir em qualidade e não em quantidade”, conclui. 

Para acompanhar melhor o trabalho do ator Eduardo Martini, siga-o nas redes:

Facebook: Eduardo Martini

Instagram: @eduardomartini

About The Author

Mariana Mascarenhas

Jornalista e Mestra em Ciências Humanas. Amante das artes em suas mais variadas formas: cinema, música, exposição, literatura…. Teatro então? Nem se fala! Busca estar sempre antenada com a programação teatral para conferir aquela peça que está dando o que falar: seja para divertir, emocionar ou refletir. Só conferir os textos e ficar de olho no que tá rolando por aí.

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