Em entrevista o cineasta fala sobre o filme e sobre o cenário de incertezas causado pela coronavírus

O ator e cineasta Bernardo Barreto, radicado em Nova York, trabalha atualmente na pós-produção do filme americano “Ballad of a Hustler”, dirigido pelo Heitor Dhalia. Barreto protagoniza o longa e também assina o roteiro. O elenco conta com nomes como a atriz Andréa Beltrão. 

O cineasta, que já participou de mais de 20 filmes (entre curtas e longas) e em produções da Rede Globo. No momento conquista seu espaço como cineasta, por meio da Berny Filmes, sua própria produtora de cinema, que opera em NY e no Brasil.

“Ballad of a Hustler” fala sobre a vida de imigrantes latinos nos Estados Unidos e a política de imigração do país. Segundo ele, não é uma história biográfica, mas foi pensado a partir do ponto de vista da vivência de Barreto nos EUA. “O filme aborda questões humanitárias importantes. Fala sobre abandono, latinos e imigrantes como eu”, afirma.

Ele veio para o Brasil para finalizar o filme com sua equipe e se deparou com a questão do isolamento social, implementada para evitar a disseminação da COVID-19, e agora enfrenta os desafios de finalizar um longa em meio às restrições de circulação, com a incerteza sobre o período de duração da pandemia e os cancelamentos de grandes festivais, onde pretende estrear o filme.

O Matraca Cultural conversou com o cineasta. Confiram a entrevista na íntegra.

Matraca Cultural – Você escreveu Ballad of a Hustler já pensando nele para o formato de filme? Como foi o processo de criação?
Bernardo Barreto Sim, sempre foi um filme. Inicialmente eu tinha um roteiro que se passava no Brasil, mas adaptei a história para Nova York, porque já estava afim de passar uns tempos fora. Apresentei o projeto para um investidor e ele se interessou. Me mudei para NY, outros produtores entraram no projeto e fomos desenvolvendo. Tudo foi se transformando ao longo desses quatro anos. A história inicial era totalmente diferente da última versão do roteiro.

MC – Quais foram as suas inspirações para criar a história e o filme?
BB – Todos os projetos que escrevi até hoje levantam questionamentos e para mim era importante que o filme não fosse só entretenimento. Parei para refletir sobre as questões no mundo naquele momento e como isso se refletia na minha vida. Foi um processo de pesquisa e meditação. 

Quando escrevo é geralmente assim: uma parte é pessoal, trazendo a minha vivência e o que eu quero expressar. A outra é crítica, na qual levanto um assunto que considero relevante. Nesse caso abordo a política de imigração americana. No final tudo é ficção. É um filme sobre abandono, com base em um panorama real, e tem muita inspiração de pessoas e situações da minha vida.

Cenas do filme Ballad of a Hustler

MC – E como foi escolha do elenco do filme?
BB – A escolha do elenco foi um processo normal. Contratei um diretor de elenco (optamos por um imigrante latino), que trabalha com base na descrição dos personagens. Eu queria um casting diversificado… Temos muitos imigrantes, principalmente latinos, negros, e também uma personagem transexual.

À época do casting, o Heitor Dhalia, que dirige o filme, estava no Brasil esperando o visto dele ser aprovado. Então ele me pediu para estar presente nos testes lendo com os atores.

Com os testes editados e pré-selecionados pelo diretor de casting, nós três assistimos e trocamos opiniões. A escolha foi feita de forma democrática. Indiquei muitos amigos que tinham o perfil, mas não falei nada para não interferir no julgamento. Três deles foram selecionados e arrebentaram no filme.

MC – Este é o seu primeiro filme em inglês? Há grande diferenças entre fazer filme em inglês e em português?
BB – Já havia feito o longa “Rinha”, do Marcelo Galvão, em que grande parte da história era em inglês, e escrevi o curta “Who’s gonna fuck my wife?”, no qual contraceno com o Cauã Reymond, em inglês.

A diferença entre fazer filme em uma ou outra língua, é que o português é a minha língua materna, meu primeiro idioma. Eu falo inglês muito bem, mas para falar como americano de NY, eu trabalhei com uma fono.

Fernanda Krumel trabalhando na edição durante a quarentena

MC Em qual fase de produção o filme está nesse momento? A pandemia do COVID-19 afetou de alguma forma o cronograma de lançamento ou da produção em si? Como?
BB – Neste momento estamos finalizando a edição. Eu, a editora e o Heitor estamos trabalhando remotamente. Eu estou em São Paulo, apesar de não nos encontrarmos.

Por enquanto o filme ainda está longo, com mais de 2h. Agora chegamos na fase de cortar algumas partes para ficar um pouco menor. Espero até o final do mês terminar a edição.

O coronavírus afetou, porque a gente não tem a menor ideia de quando isto acaba. Mesmo que tenhamos o filme pronto, não sei como vai ficar a situação dos festivais, e a nossa ideia é tentar lançar o filme em um grande festival. Não sabemos se as datas dos festivais que estávamos almejando irão se manter, nem mesmo se os cinemas vão se normalizar até o final do ano. É uma série de incógnitas.

O fato de não nos encontrarmos, ter que fazer upload do filme de lá e de de cá, também ralenta um pouco esta fase de pós-produção.

A vantagem é justamente o fato de estarmos em pós-produção, ninguém está filmando. Talvez tenha uma necessidade de mercado, uma valorização dos produtos que estão em finalização. Mas não penso nisso agora. O mundo está parado em todas as áreas e na nossa também. Não tem jeito, temos que ter paciência.

MC – O orçamento foi afetado por causa da crise atual? Quais são as principais dificuldades de tocar uma produção durante esse período?
BB – Como nós já havíamos delineado tudo antes de começar essa pandemia, o orçamento se manteve para nós. Muitos preços estão caindo, mas nós decidimos não renegociar valores com os profissionais. Está todo mundo dependendo de dinheiro para viver, contando com os trabalhos que já estavam engatados. Nós vamos manter os pagamentos dentro do cronograma e nos adaptar às distâncias para as coisas funcionarem.

MC – Você avalia lançar em plataformas digitais, dependendo da duração da quarentena?
BB – É uma pena, né? Para mim, o suprassumo, o sonho de todo cineasta, é ver seu filme no cinema. Mas o streaming está aí, é uma ferramenta super legal e é onde a grande massa assiste filmes hoje.

Não sei dizer, porque a gente não tem noção de quanto tempo a situação vai durar. Espero que passe logo e que as coisas se normalizem. 

Claro que é uma coisa que a gente teme e não tem como controlar. Se isto acontecer e tivermos que lançar em streaming, assim será feito.

MC – Você pode dar a dica de três filmes para as pessoas assistirem nesse período de reclusão?
BB – “Os animais somos nós”, “Joias brutas” e “Aquário”.


About The Author

Antonio Saturnino

Jornalista, atleta frustrado, cantor de karaokê e pai de pets. Ama música e escrever sobre o tema durante anos lhe permitiu conhecer novos cantores e estilos musicais, então vocês verão muita coisa diferente e nova por aqui. Dança no meio da rua, adora cozinhar e estar em conexão com a natureza.

Related Posts

Leave a Reply

Your email address will not be published.