Um hino de positividade para acalentar os corações mais aflitos, em meio a pandemia da COVID-19; programas cômicos; palestras educativas sobre a formação do palhaço; momentos de oração online; lives com a arrecadação revertida para ações sociais: essas têm sido alguma das atividades feitas por artistas, dentro e fora do Brasil, neste período de quarentena e que transformaram a vida de muitas pessoas. O Matraca Cultural conversou com eles e conta mais para vocês: 

Andrà tutto bene (Vai ficar tudo bem)

A frase em italiano que se espalhou pelo mundo como forma de apoio ao planeta, começando pela Itália, neste cenário pandêmico, virou tema da canção do cantor e compositor português Cristóvam. 

Nascido em Açores, ele criou a canção como resposta ao sofrimento da humanidade devido à pandemia, com o intuito de transmitir uma mensagem de esperança para todos aqueles que estão em isolamento social e, principalmente, aos profissionais da saúde, que estão na linha de frente de combate ao novo coronavírus, como uma grande homenagem a eles. “Eu estava com a mesma sensação de ansiedade e receio que tem percorrido o mundo e a minha forma de lidar com ela foi compor a canção”, afirma Cristóvam.

O cantor Cristóvam

Para ilustrar sua letra, ele contou com a parceria de Pedro Varela, diretor do clipe, e assim, foram tendo várias ideias que culminaram na gravação de pessoas em suas quarentenas pelos quatro cantos do mundo, sendo que o processo de direção foi todo online. Todo o trabalho de composição da música e produção do filme foi concluído em cinco dias. 

Cristóvam conta que teve todo um cuidado requerido na preparação da canção, afinal ele diz que pretendia falar de tudo e não apenas das “coisas leves” de forma cautelosa. Mas, o que ele não imaginava é que, em menos de 48 horas após a inserção do clipe no YouTube, ele viralizaria pelo planeta, como aconteceu. Algo surpreendente para ele já que o alcance foi completamente orgânico, sem qualquer campanha de marketing ou investimento publicitário. “Mas, a surpresa maior veio no dia seguinte, quando a canção foi tocada nas melhores rádios de Portugal, sem que a tivéssemos enviado para elas”, completa. 

Diante de tamanha repercussão, Cristóvam recebeu inúmeras mensagens de médicos, enfermeiros, pacientes, entre outros, de diferentes países, incluindo o Brasil, manifestando palavras de carinho, gratidão e elogio. 

Dentre todas elas, ele conta que a mensagem de um médico alemão  foi a que mais lhe marcou. No texto, o profissional da saúde  dizia ter visto o clipe, justamente, no dia em que perdera o pai, em razão da COVID-19, e que, para ele, tanto a música, quanto o filme haviam sido o único alento naquele momento.  “Enquanto autor da canção, foi uma das coisas mais arrepiantes e bonitas que eu podia ter ouvido de alguém, num momento de dor tão grande: sentir conforto nas minhas palavras. Guardarei essa mensagem para sempre como um momento alto de minha carreira”, afirma o cantor, que não segurou  as lágrimas ao se deparar com tal situação.

Cristóvam acredita que, com a pandemia, o ser humano se tornou mais solidário: “O que nós levamos desta vida são as nossas relações com as pessoas, o amor que partilhamos uns com os outros e, quando estamos a lidar com situações como a atual, é normal que essas prioridades se reorganizem na nossa cabeça”, ressalta. Para ele, vivemos em um mundo marcado pelo consumismo e materialismo, onde administramos muito mal o nosso tempo, e a pandemia nos fez perceber a importância da solidariedade e amor ao próximo. 

O cantor também apresenta uma visão positiva para o cenário cultural, pois acredita que as circunstâncias atuais farão com que as pessoas valorizem mais a cultura nestes tempos de isolamento, já que ela acaba por ser o seu universo, especialmente para aquelas que moram sozinhas.

Músico há alguns anos, Cristóvam lançou seu primeiro disco solo em 2018, intitulado Hopes and Dreams. No mesmo ano, ele tornou-se o primeiro artista português a atingir o primeiro lugar no prestigiado International Songwriting Competition, com uma canção chamada Faith & Wine. Após esse lançamento, ele saiu em turnê pela Europa em mais de 30 apresentações por vários países. 

Quem quiser acessar o clipe Andrà tutto bene basta clicar aqui.

A arte do clown 

Saindo do palco e da sala de aula, momentaneamente, e indo para o espaço virtual, com o intuito de continuar, não somente, a divertir o público, como a ensiná-lo a arte de ser clown, trabalhando com a imagem do palhaço: é assim que o ator e docente Marcelo Colavitto tem lidado com este momento de isolamento social. Membro fundador do grupo Meu Clown, criado em São Paulo, em 2005, com o objetivo de promover retiros, workshops e espetáculos teatrais, tendo o clown como filosofia de vida, ele explica que tem realizado diversas atividades online no momento. 

O ator e docente Marcelo Colavitto

 Dentre elas está a gravação de um programa de variedades lúdico e cômico, a partir da figura do palhaço, o Meu Clown Nacional, criado por ele e por Alexandre Muniz, com notícias, receitas, músicas, previsão do tempo etc. Para se conectar ainda mais com o público, Colavitto conta que, no programa, também respondem a perguntas da “audiência”, a partir das mensagens enviadas pelas redes sociais. “Isso ajuda a estarmos próximos, mesmo dentro da realidade atual de afastamento social”, completa.

Atuando, também, como docente, ele não deixou de ensinar neste período de quarentena. No dia 29/05, por exemplo, a partir das 16h, ele promoverá a palestra Palhaçaria e Educação: vivências clownescas para um aprendizado lúdico pelo Meet Google (meet.google.com/uek-ynnw-uez), a convite do professor Arnaldo Szlachta, da Universidade Federal de Pernambuco. “Como minha pesquisa do Doutorado versa sobre a formação do palhaço e sua convergência com aspectos da infância, discorrerei sobre esta investigação que conta com aproximações da minha trajetória enquanto clown e como docente também.”

Com início da carreira artística no ano de 1992, em um espetáculo com palhaços chamado Gran Circo Fluídico do grupo Eurípedes, com direção de Hamilton Saraiva, Colavitto conta que, mesmo sem nenhuma formação específica em palhaçaria, na época, e cursando graduação em Artes Cênicas, ele acabou se destacando na peça. “Em 2002, dez anos depois, fiz um curso de clown em Padova, na Itália. A partir daí, eu me uni com outra artista clown, chamada Andrea Egydio, e criamos um curso de iniciação e treinamento clown. Elaboramos cursos extensivos e intensivos em forma de retiro”. 

Em 2011, ele começou a lecionar na Universidade Federal de Maringá, onde abriu um grupo de pesquisa em que se formaram vários palhaços e também chegou a ministrar oficinas de clown em Lisboa, Portugal, e em Taipei, Taiwan. Em 2015, ele publicou um livro, intitulado Meu Clown: uma pedagogia para a arte da palhaçaria.

 “A palhaçaria dá sentido à minha vida, pois expressa a minha forma de ver o mundo e também é o meu ofício enquanto artista. Infelizmente, o distanciamento não contribui para o desenvolvimento dessa arte, pois o palhaço precisa da interação com sua audiência”, afirma Colavitto, que considera o olho no olho como algo fundamental para haver troca e impulsionar a arte cênica, que depende do improviso. “Ainda não encontramos uma forma ideal, mas seguimos tentando, pelo meio digital.”

Ao contrário de Cristóvam, o docente já enxerga um cenário mais delicado para a cultura em razão da pandemia: “Infelizmente, as possibilidades de fruição artística,  através do meio digital são bastante limitadas. Observo que os grandes artistas, já consagrados, têm se reinventado e conseguido permanecer em contato com seu público. Porém, os artistas mais populares permanecem com um alcance limitado, pois não têm uma grande produção, nem todo o marketing que os famosos têm acesso.”

Colavitto vê com bastante pessimismo o futuro do cenário cultural no Brasil, já que as artes cênicas, por exemplo, costumam promover concentrações de pessoas, o que não deve ser recomendado até a descoberta de uma vacina e/ou a cura do novo coronavírus. “Sinto que, se o poder público não der a devida atenção à classe artística, passaremos por um período bem difícil para a maioria dos artistas”, conclui. 

Para conhecer melhor o trabalho do Meu Clown, basta acessar suas redes: 

Facebook: Meu Clown Maringá

Instagram: @grupomeuclown

YouTube: Meu Clown

Na próxima semana, vocês acompanharão as entrevistas com os artistas Eduardo Martins e Luiz Fernando Almeida. Aguardem!

About The Author

Mariana Mascarenhas

Jornalista e Mestra em Ciências Humanas. Amante das artes em suas mais variadas formas: cinema, música, exposição, literatura…. Teatro então? Nem se fala! Busca estar sempre antenada com a programação teatral para conferir aquela peça que está dando o que falar: seja para divertir, emocionar ou refletir. Só conferir os textos e ficar de olho no que tá rolando por aí.

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