A origem negra do rock Matraca Cultural julho 19, 2019 OPINIÃO O rock, esse gênero musical tão diverso, é a junção de inúmeros gêneros musicais como o blues, jazz, rhythm & blues e country, sendo os três primeiros partes integrantes da cultura negra estadunidense. A origem do rock and roll é creditada à uma mulher negra estadunidense, Rosetta Nubin, conhecida pelo nome artístico Sister Rosetta Tharpe. Sister Rosetta nasceu no dia 20 de março de 1915 nos Estados Unidos e já na década de 1920 era uma das poucas mulheres negras a tocar guitarra. Seu primeiro hit gravado foi Rock Me, em 1937, e a música que é considerada a primeira do rock and roll se chama Strange Things Happening Every Day. Sua carreira começou na igreja, pois sua mãe era pastora evangélica. Sister Rosetta unia o profano e o sagrado em sua forma de tocar que, aliado à sua voz marcante, nos mostra a resistência de uma mulher negra nos Estados Unidos no século passado, pois foi uma das poucas a tocar guitarra na época nas primeiras décadas do século XX. Sua morte ocorreu em 9 de outubro de 1973, com 58 anos. Mesmo com toda a sua importância e influência sobre músicos como Elvis Presley, sua contribuição foi silenciada durante muitas décadas. Apenas no século XXI o resgate por sua memória foi mais efetivo com a publicação do livro Shout, Sister, Shout, em 2007, da escritora Gayle Wald. Em 2008 o governador da Pensilvânia Edward Rendell, declarou o dia 11 de janeiro como o dia de Sister Rosetta Tharpe no estado. Por fim, em 2011, foi realizado o documentário The Godmother of Rock & Roll: Sister Rosetta Tharpe, do diretor Mick Csáky. Outro exemplo de silenciamento, não no rock propriamente dito, mas em um gênero musical que o antecedeu chamado blues, foi do músico Robert Johnson. Ele foi um cantor e guitarrista de blues estadunidense. Existem várias histórias sobre a sua existência, inclusive que vendeu sua alma ao diabo, mito reforçado pelas músicas Crossroads Blues, Me And The Devil Blues e Hellhound On My Trail. Infelizmente, o real motivo de sua morte foi uma pneumonia que contraiu três dias depois de ser envenenado. Consta em sua certidão de óbito que não havia médico para atendê-lo, mas sabemos que nos Estados Unidos do século passado, sua cor “colaborou” para esse não atendimento, portanto, o cantor foi mais uma vítima do racismo. Existem inúmeros exemplos de músicos negros do rock ou de gêneros que o antecederam que gravaram músicas que só alcançaram sucesso quando foram regravadas por artistas brancos. Willie Mae Thornton, mais conhecida como Big Mama Thornton, gravou a música Hound Dog na década de 1950, mas quem fez mais sucesso foi Elvis Presley ao regravar a mesma música alguns anos mais tarde. No punk rock também há uma banda negra que antecedeu o que entendemos por punk. A banda Death foi criada na década de 1970 pelos irmãos Bobby, Dennis e David Hackney, que começaram a tocar em Detroit, a conhecida “cidade do rock”. Em 1975, eles gravaram sete músicas, porém, foi pedido para trocarem o nome da banda para algo mais comercial e com a recusa, foram deixados de lado pela gravadora. A banda se desfez em 1977, mas os irmãos Hackney continuaram no mundo da música. O grupo ressurgiu em 2009 com a descoberta dos materiais antigos, a partir daí foi lançado o álbum For The Whole World To See, que foi gravado em 1974. Um documentário foi lançado em 2012, intitulado A Band Called Death. A banda visitou o Brasil em 2016 e 2017 em shows memoráveis. Tive a honra de assistir um show dessa banda em 2016 no Sesc Belenzinho e confesso que foi um divisor de águas na minha vida. Quando pesquisamos a fundo a história, percebemos que sempre haverá algo que remete às pessoas negras, temos bons exemplos além do rock, como o tango ou mesmo o Egito antigo. Mas voltando ao rock, que é o que nos interessa no momento, não existe rock sem as contribuições de negras e negros estadunidenses e negar isso é de uma insensatez imensa. A História tem o poder tanto de preservar, quanto de silenciar os acontecimentos da humanidade com o tempo. E isso não seria diferente quando falamos da história do rock, que foi embranquecido e hoje em dia as pessoas negras que gostam deste gênero musical são discriminadas e consideradas não conhecedoras das contribuições de seu povo. Vamos fazer um exercício? Quantos músicos negros do rock você conhece? Já tinha ouvido falar em Sister Rosetta Tharpe? Fazia ideia que o rock tinha sido criado por uma mulher negra estadunidense? *Juliana Aparecida é historiadora, professora e especialista em história e cultura afro-brasileira e africana. Criadora das páginas O Egito negro de Cheikh Anta Diop e Metaleiras Negras. Leave a Reply Cancel ReplyYour email address will not be published.CommentName* Email* Website