Recentemente eu perdi um amigo muito especial, que, assim como muitos, a COVID levou. Momento esse que dedico carinho e solidariedade às famílias de também perderam uma pessoa querida.

Esse amigo foi meu primeiro amor na adolescência. Ter alguém para dizer “eu te amo” naquela idade, que para muitos era normal e romântico, para mim e outros que já se identificavam como gays, era muito difícil.

Eu sabia, ele sabia e, na verdade, todo mundo sabia. Mas ninguém dizia, não era fácil dizer algo que era já tão bom sentir.

Eu, já no meio do teatro, de gente “moderna” e descolada, ainda era cobrado pelos outros e por mim para viver uma história que era não tão minha, as cobranças básicas, sabe? “Cadê as namoradas?”… Eu só queria dizer o tal do “eu te amo” para ele.

Eu guardei por muito tempo, cantei, fiz cena, fingi, escondi, chorei, sofri e até poesia eu fiz, tudo em silêncio.

Até que decidi que tudo ia ser diferente, me lembro exatamente do dia. Combinei que precisava contar algo para ele e, a partir daquele segundo, eu não pensava em outras coisas. Minha respiração ficou acelerada o dia todo, nem sei como trabalhei. Minha cabeça estava completamente voltada para aquela noite, a tão esperada noite.

Chegando em casa, conversarmos por horas madrugada adentro… minha boca secava, meu coração já batia muito alto, tal qual tambores e tamborins na avenida do samba… e ele ouvia.

E lá pelas tantas da manhã, eu disse: Eu te amo.

Pasmem, existem rapazes que amam outros rapazes, não é só sexo. #ésobreisso

Nem sabia ao certo se queria ouvir um “eu te amo” de volta, eu só precisava dizer Eu te amo.

Depois dessa noite muita coisa mudou. Passei a dizer “eu te amo’ para mim e para quem eu sentisse vontade.

Hoje, passados anos, com sua ida, abrupta e muito dolorosa, me lembrei daquele dia e pensei no quanto eu sofri, até um sofrer meio dramático, poético, mas um sofrer. Penso que se o amor fosse recebido e acolhido independente da orientação sexual, eu teria ficado mais leve e tranquilo mais rápido. Talvez, bem provável.

O tempo passa rápido e a vida é breve, construir memórias faz parte de nós. Se hoje você ainda não disse aquele “eu te amo” gostoso, vai lá, corre… dá tempo. Tenha vergonha não, viu?! Amar é lindo!

Eu te amo
Eu te amo e Eu te amo.

(…)

* Fazendo alusão ao amor poético, ingênuo e dramático imprimido nesse texto, escolhi como capa o Pierrot, personagem da Commedia dell’Arte. Uma variação francesa do Pedrolino italiano, do século 19, que virou símbolo do amor: um palhaço triste, eternamente apaixonado pela Colombina.
A obra é a primeira tela que pintei, em óleo s/tela, intitulada Autorretrato, no ano de 2003. Pedindo licença de compartilhar arte e sentimentos com vocês!

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Matraca Cultural

Cultura é entretenimento, é reflexão. Ela está presente em todas as nações, nas grandes revoluções, nas periferias e nos momentos de repressão. Ela está na rima do rap, no drama teatral, no movimento da dança, nas vidas da tela do cinema, nos contos fantasiosos de livros e em diversas manifestações humanas. Matraca Cutural é boca aberta para a música, dança, teatro, exposições, cinema e mostras e usa a cultura como vetor de transformação, de respeito às diferenças e importantes reflexões.

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